2005-11-29

ARGUMENTAR... Não vale a pena!!

O desprezo da argumentação é, a meu ver, um dos aspectos mais inquietantes do nosso quotidiano.
Damos uma opinião e dizem-nos logo: - Isso é muito discutível.
Apresentamos as nossas razões, mas não as discutem, limitando-se a responder: - Como é que pode estar de acordo com fulano, que está ao serviço de beltrano, que mudou de casaca, etc.
Os mais belicosos rugem: - Isso é o que você diz.
Aceitamos, então, que o que dizemos é, de facto, dito por nós e não pelo Espírito Santo, mas que, mesmo assim, desejaríamos que refutassem serenamente as nossas ideias e calmamente as discutissem. Respondem-nos: - Você tem a sua ideia e eu tenho a minha.
Admitimos de bom grado tal disparidade e tentamos aproveitar a ocasião para apresentar motivos compreensíveis que sustentem uma e outra ideia, para que possamos escolher a mais bem fundamentada. O outro indigna-se. É que ele não é dos que estão dispostos a alterar o que pensam por causa de algo trivial como duas ou três razões. Ele é como é e pensa como pensa e sempre foi assim (...). Costuma concluir triunfante: - Eu tenho tanto direito como você a pensar como quiser.
E nem vale a pena dizer-lhe que, em questão de opiniões, o que importa não é o óbvio e indiscutível direito de as manter; antes, os pouco óbvios e muito discutíveis argumentos que sustentam a sua manutenção.
F. SAVATER

2005-11-22

Retórica e Democracia

" O direito de todos os cidadãos à palavra pública e a eficácia desta palavra levaram a tomar a linguagem como objecto de estudo e não apenas a servir-se dela como instrumento espontâneo de trocas comunicacionais(...). A persuasão pela palavra opõe-se, assim, não só ao constragimento físico, mas também à autoridade indiscutível e não pode exercer-se senão dentro de certas condições: igualdade daquele que fala e daquele ou daqueles que escutam, liberdade de tomar a palavra e liberdade de dar ou de recusar assentimento ao que é dito. "
DESBORDES, La Rhétorique Antique

2005-11-16

RETÓRICA VS. FILOSOFIA

A retórica é sem dúvida tão antiga como a filosofia.(... ) A este título é a sua mais velha inimiga e a sua mais antiga aliada. A sua mais antiga inimiga: é sempre possível que a arte de "bem dizer" se liberte do cuidado de "dizer a verdade"; a técnica fundada sobre o conhecimento das causas que engendram os efeitos da persuasão dá um poder extraordinário a quem a domine perfeitamente: o poder de dispor das palavras sem as coisas; e de dispor dos homens ao dispor das palavras. Talvez se torne necessário compreender que a possibilidade desta cisão acompanha toda a história do discurso humano.(...)
Mas a filosofia jamais esteve em posição de destruir a retórica ou de a absorver. Os próprios lugares em que a eloquência faz jus dos seus prestígios - tribunal, asembleia, jogos públicos - são lugares que não foram engendrados pela filosofia e que ela não pode, portanto, propor-se suprimir. O seu próprio discurso é apenas um discurso entre outros e a pretensão à verdade que habita o seu discurso exclui-a da esfera do poder.
Uma possibilidade permanece aberta: delimitar os usos legítimos da fala poderosa, forçar a linha que separa o uso do abuso, instituir filosoficamente as ligações entre a esfera da validade da retórica e aquela em que a filosofia reina. A retórica de Aristóteles constitui a mais espantosa dessas tentativas de institucionalização da retórica a partir da filosofia.
RICOEUR, Metáfora Viva
Rés editora
Manual de Filosofia Razão e Diálogo p. 150



2005-11-14

A Importância dos Pressupostos

CRER E JUSTIFICAR

Em viagem pela Rede, encontrei-me com este texto do professor Guido Imaguire. Pela pertinência que revela, transcrevo-o de seguida:

Que o sol amanhã de manhã voltará novamente a nascer, é uma convicção que têm leigos e cientistas. O que difere então entre senso comum e conhecimento científico? A resposta é simples: Enquanto no senso comum as pessoas acreditam apenas pelo hábito (porque o sol sempre nasceu, amanhã deverá nascer de novo), sem saber dar razões para o seu juízo, o cientista (neste caso o astrónomo) sabe explicar porque é que o sol amanhã nascerá, baseando-se na teoria do movimento de rotação da terra, entre outras. O leigo acredita sem saber as razões, o cientista conhece as razões


Como síntese significativa não resisto a citar Montaigne:

Os homens tendem a acreditar sobretudo naquilo que menos compreendem.”


AB10

2005-11-09

Filosofia: Problema, Tese e Argumento

Quando lemos um texto de filosofia devemos concentrar a nossa atenção sobre os seguintes aspectos:

· os problemas
· as teorias
· os argumentos

Os bons filósofos costumam começar por enunciar os problemas que estão a procurar resolver nas suas obras. É o que faz Descartes, que declara logo na primeira meditação que está preocupado com o problema do fundamento do conhecimento. Nos diálogos de Platão também é costume surgir logo após o preâmbulo dramático o enunciado do problema, muitas vezes uma pergunta de Sócrates, como «O que é a piedade
Mas os pormenores dos problemas filosóficos são subtis e intrincados. É fácil de ver que o fundamento do conhecimento é o problema que Descartes procura resolver nas Meditações. Mas em que consiste exactamente este problema? É aqui que o conceito de «formulação» tem de ser introduzido. Quando eu andava no liceu usava-se muitas vezes a expressão «explicar pelas suas próprias palavras». Esta é uma boa formulação do que é a formulação.

A formulação de um problema filosófico (...) é enunciar esse problema de forma clara, organizada e pormenorizada — claro que a melhor forma de o fazer é no papel, mas podemos tentar fazê-lo, de forma mais informal, mesmo quando estamos a ler, ou oralmente, nas aulas e com os amigos.

Quando formulamos um problema filosófico devemos estar preocupados com os seguintes aspectos:

· Qual é a sua formulação exacta?
· Como se origina o problema?
· Quais são as suas consequências?

A formulação correcta de um problema, de uma teoria ou de um argumento é o indício mais seguro de que o autor da formulação compreendeu o que está a dizer.

Numa boa formulação as relações lógicas têm de se tornar claras. As suas subtilezas têm de ser cuidadosamente expostas, as suas obscuridades clarificadas, as suas ambiguidades desambiguadas. O inverso disto é a paráfrase e as citações superabundantes, óptimas para dar volume e evitar trabalho (no meu tempo chamava-se "palha" a isto).

Se não percebemos muito bem uma certa passagem, o melhor é citá-la: quem nos lê ficará com a sensação que é estúpido porque não percebe algo que o autor deve ter percebido, caso contrário não teria citado. Esta estratégia, claro, é desonesta. É preferível escrever 5 linhas claras onde se explica por que razão não se percebeu uma passagem do que encher 5 páginas obscuras onde se cita a passagem e mais 30 comentadores e outras tantas paráfrases, ocultando o facto crucial de não se ter percebido.

Por vezes, a expressão clara de uma incompreensão tem valor filosófico porque essa incompreensão pode ela própria ter valor filosófico: a passagem em causa pode ser filosófica ou logicamente incongruente. Ao fazê-lo, o estudante mostra que leu com atenção crítica; ao limitar-se à paráfrase e à citação bacoca o estudante mostra que se limitou a prosseguir uma função mecânica e acrítica — o contrário do espírito crítico da filosofia.

(...)
As origens e as consequências que nos interessam enquanto estudantes de filosofia são, claro, as origens e consequências filosóficas. Por exemplo, depois de formularmos de forma correcta o problema do conhecimento que Descartes enuncia no início da primeira meditação, podemos perguntar: que razões o levam a pensar que o problema do fundamento do conhecimento existe realmente? Não será apenas uma fantasia? Como se dá origem ao problema? Na verdade, uma das reacções negativas mais comuns em relação à filosofia é o menosprezo pelos seus problemas. Mas uma coisa é menosprezar sumariamente um problema como irrelevante ou mal formulado ou como o resultado de uma confusão conceptual; outra coisa — e isto é já um trabalho filosófico — é elaborar essa reacção e mostrar que o problema X que o filósofo Y levanta resulta de um erro. Na verdade, grande parte do trabalho dos filósofos consiste em tentar mostrar que os outros filósofos cometeram esse tipo de erros.

Perceber as origens de um problema filosófico é perceber de que depende a sua existência. (...) Claro que não se espera que um estudante de filosofia, ao tentar descobrir as origens dos problemas filosóficos que está a ler, tenha a mesma capacidade crítica que têm os filósofos altamente especializados. Mas têm de começar a ter alguma dessa capacidade crítica. E a melhor coisa a fazer para desenvolver uma capacidade é treiná-la pacientemente a partir de exercícios simples.

Quando procuramos as origens de um problema filosófico perguntamo-nos como é que as coisas têm de ser para que aquele problema exista e o que aconteceria se as coisas fossem ligeiramente diferentes. Não é importante, inicialmente, se é para nós claro que as coisas são de facto como têm de ser para que se levante tal problema; mas é importante perceber claramente que para se levantar tal problema as coisas têm de ser desta maneira e daquela. Mas de que coisas se trata? Não se trata, com certeza, de dados acerca da iliteracia dos portugueses, ou da análise do trabalho dos jornalistas portugueses. Trata-se, sim, de certos aspectos da natureza da linguagem, do mundo, e dos nossos conceitos acerca destas duas coisas. Por exemplo: que conceito de conhecimento e de linguagem tem Descartes de ter para que se levante o problema do fundamento do conhecimento?

Tudo quanto disse em relação às origens se aplica às consequências. Neste caso, temos de nos perguntar o que somos obrigados a aceitar se aceitarmos uma certa formulação de um certo problema. Se aceitarmos, como Descartes, que existe um problema com o fundamento do conhecimento, o que se segue daí? Poderemos continuar a conceber a ciência, por exemplo, como concebíamos antes? Ou não? E a religião? Se o conhecimento precisa de fundamentos, que temos de fazer para os encontrar? E qual será o método para o fazer?

Extraído, com a devida vénia, do artigo «Como Estudar Filosofia», do Professor Desidério Murcho,
AB10

2005-11-08

A ARGUMENTAÇÃO COMO COMUNICAÇÃO

A prova demonstrativa diz respeito à verdade de uma conclusão ou, pelo menos, à sua relação necessária com as premissas. Em princípio, a lógica formal não se ocupa da adesão de qualquer coisa à verdade das proposições em vista. A prova é impessoal, e a sua validade não depende em nada da opinião: aquele que infere no seio de um dado sistema só pode aceitar o resultado das suas deduções. Em contrapartida, toda a argumentação é pessoal; dirige-se a indivíduos em relação aos quais ela se esforça por obter a adesão, a qual é susceptível de ter uma intensidade variável.
Enquanto um sistema dedutivo se apresenta como isolado de todo um contexto, uma argumentação é necessariamente situada. Para ser eficaz, esta exige um contacto entre sujeitos. É necessário que o orador (aquele que apresenta a argumentação oralmente ou por escrito) queira exercer mediante o seu discurso uma acção sobre o auditório, isto é, sobre o conjunto daqueles que se propõe influenciar. Por outro lado, é necessário que os auditores estejam dispostos a escutar, a sofrer a acção do orador, e isto a propósito de uma questão determinada.
C. PERERLMAN
"ARGUMENTAÇÃO" in Enc. Einaudi

2005-11-02

CORRECÇÃO do TESTE - NOV. 2005

1. A lógica tem como tarefa regular o perfeito discurso da razão e oferecer o bom caminho para o correcto exercício da linguagem e do pensamento na procura da verdade.
2. A verdade diz respeito à relação que se possa estabelecer com a realidade; um pensamento diz-se válido quando os seus elementos formam um todo coerente, sem contradição interna nem incompatibilidade.
3. O conceito é uma ideia geral e abstracta que agrupa objectos diferentes, mas com características comuns.
4. O juízo é a relação estabelecida entre, pelo menos, dois conceitos - de afirmação ou negação.
5. O raciocínio é a relação estabelecida entre pelo menos dois juízos, dos quais se infere uma conclusão.
6. I. c); II. a); III. b)
7. a) Algumas cenouras não têm rama - Particular Negativa
b) Algumas vacas habitam a lua - Particular Afirmativa
8. " A pena de morte é injustificável".
II
1. a) Alguns que acreditam em Deus são racionalistas
Todos os racionalistas admiram geometria
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Todos os que admiram geometria acreditam em Deus
- Termo distribuído na conclusão, mas não na premissa;
- A conclusão nbão segue a parte mais fraca;
O silogismo é inválido.
b) Nenhum dos que apreciam física desvaloriza as ciências empíricas
Alguns racionalistas não desvalorizam as ciências empíricas
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Alguns racionalistas apreciam física
- De duas premissas negativas não se segue conclusão;
- A conclusão não segue a parte mais fraca;
O silogismo é inválido
2. O silogismo em análise revela uma falácia do ilícito menor - o termo menor aparece distribuído na conclusão mas não na premissa.
3. Nenhuma árvore é inteligente
Todo o artista é inteligente
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Nenhum artista é árvore.
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